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DES-INSUBSTANCIALIZAR é preciso!



História, Literatura e Política, são os temas centrais abordados neste Blog. A intenção é desenvolver reflexões e análises sobre os processos que ultimamente estão em andamento no Brasil, bem como discutir os seus vínculos com situações mais amplas. Longe de ser um espaço voltado a amplificar as atuais posturas e discursos que se apresentam como "apolíticos", seu foco é demonstrar que não há vida social sem o exercício cotidiano da política. Portanto, a arena e a discussão política são o seu fim maior.

Realizar tal propósito – aproximando história e literatura – exige que sejam ultrapassadas as fronteiras do óbvio e da obviedade, dos discursos e das posições auto evidentes, as quais eufemisticamente se dizem imparciais e isentas. Como aquelas opiniões que afirmam que os recém-eleitos presidente dos Estados Unidos e o prefeito de São Paulo são homens “não-políticos”. Qualificativo que, em seu conteúdo, busca isentar os seus destinatários de terem sido como que “contaminados” pelo perverso vírus da política, a qual, segundo este ponto de vista, a tudo e a todos corrompe.


 

Ele

Ele tem dois adversários: o primeiro acossa-o por trás, da origem. O segundo bloqueia-lhe o caminho à frente. Ele luta com ambos. Na verdade, o primeiro ajuda-o na luta contra o segundo, pois quer empurrá-lo para frente, e, do mesmo modo, o segundo o auxilia na luta contra o primeiro, uma vez que o empurra para trás. Mas isso é assim apenas teoricamente. Pois não há ali apenas os dois adversários, mas também ele mesmo, e quem sabe realmente de suas intenções? Seu sonho, porém, é em alguma ocasião, num momento imprevisto – e isso exigiria a noite mais escura que jamais o foi nenhuma noite -, saltar fora da linha de combate para ser alçado, por conta de sua experiência de luta, à posição de juiz sobre os adversários que lutam entre si.Franz Kafka (1920).
 

Em uma sociedade que diuturnamente vem sendo assaltada pelo discurso do "politicamente correto" é importante que as pessoas tomem posições e, especialmente, que as suas opiniões alcancem a arena pública, lugar onde serão debatidas. Entretanto, os adeptos do “politicamente correto” invariavelmente não tem uma relação muito confortável com a crítica, principalmente com a de natureza radical. Aquela ou aquelas que tem a capacidade de romper com as aparências e chegar até as estruturas. Desta forma, são eficientes em demonstrar que, na vida em sociedade e na política, é muito comum dizer uma coisa dizendo outra, isto é, praticar eufemismos. O eufemismo, sem grandes dúvidas, é uma das peculiaridades daqueles que se apresentam como, defendem e buscam ser “politicamente corretos”. Querem a todo custo negar o conflito, deslegitimando seus motivos e causas por meio da naturalização de processos que são sociais, portanto, dinâmicos e conflituosos em sua essência.  Pessoas a quem Julio Cortázar chamaria de “famas” (seres pretenciosos e formais) ou de “esperanças” (seres aborrecidos e ignorantes). Contudo, cada vez mais é imperioso aprender que o mundo precisa de “Cronópios”, isto é, criaturas idealistas, sensíveis e ingênuas. Gente disposta a lutar pelo mundo, pela humanidade e por sua conservação. A ação de conservar o mundo e a humanidade, entretanto, não deve ser entendida como sinônimo de manutenção do status quo, pois este é um dos motivos que move os famas e os esperanças. Assim, como nos ensina Hannah Arendt, conservar o mundo significa cuidar do lugar onde a humanidade realiza a sua existência. Garantir, desta maneira, às futuras gerações, nossos filhos e filhas, um ambiente onde possam viver e, pelo nascimento – um dos atos políticos por excelência – perpetuarem a si próprios e, por consequência, a nós mesmos. Neste sentido e talvez só neste, é possível afirmar que os cronópios são conservadores. Por conseguinte, se revoluções forem necessárias para garantir a perpetuidade do mundo e da humanidade, que venham as revoluções.     Abordar pontos de vista, expressá-los e debatê-los é outra preocupação do Blog. Para tanto, os textos a serem publicados têm por premissa o estabelecimento de rupturas com as dicotomias comuns e corriqueiras: ir "para além do bem e do mal", mas sem realizar a sua negação absoluta. Neste sentido, sempre é adequado fazer a pergunta do quanto o "certo" é a medida diametralmente oposta do "errado"; o comunismo do capitalismo; a revolução da conservação; o socialismo do liberalismo; a vida da morte e assim por diante...  O mundo, a sociedade e a vida são bem mais complexos do que a primeira vista se apresentam. Por conseguinte, os pares opostos que historicamente foram inventados para ordená-los e explica-los mais enganam do que iluminam. Em outras palavras, se há cronópios e famas, também há esperanças. Ainda nesta perspectiva, a ideia é a de que esperanças e famas consigam superar a sua condição cronopificando-se. Todavia, este não deve ser o ponto final da caminhada, pois os cronópios são seres em constante renovação e aperfeiçoamento. Renovar e aperfeiçoar, deste modo, são dois motivos qualificadores que os movem e definem sua condição e existência. Consequentemente, os cronópios sempre devem estar abertos ao tirocínio da crítica e a sagacidade do debate. ​Diante destas considerações, a proposta aqui é a de que a crítica e a superação da "trans", da "cons", da "substanciação" e das suas mais diferentes formas e grafias estão localizadas na insubstância. Como indica Kafka, as reflexões deste Blog pretendem caminhar na direção da noite mais sombria como nenhuma outra já foi. A partir da experiência produzida e acumulada no transcurso deste trajeto a pretensão é encontrar meios para preencher a lacuna "entre o passado e o futuro" ou, nos termos da parábola kafkiana, promover modos e motivos para proporcionar o encontro do “Eu” do “Ele” consigo mesmo. Depois de realizada a travessia, caberá a cada qual encontrar a si próprio em meio ao combate travado entre as tais forças que vem de trás nos empurrando para frente e as que vem da frente nos empurrando para trás. Tal encontro não é nada fácil e tranquilo, ele pode levar seus perseguidores a chegarem a referida noite mais sombria que jamais existiu. Muito provavelmente ela terá a feição e as características do lugar ocupado e da situação vivida por Gregor Samsa em “A Metamorfose”. Condição e momento de onde cronopicamente será possível ver o mundo de uma maneira metamorfoseada, insubstanciada.​ Chegar a insubstância exige a implosão e a explosão do real. Movimento a partir do qual será possível ir além do substancial. Por seu turno, dos cacos e do caos da substância destruída - da insubstância – será possível reconstruir o real da realidade, promovendo, desse modo, a sua destituição completa. Destituir a realidade, como ensina Virginia Woolf, significa desmantelar estereótipos, frases feitas e imaginários coagulados. Também é demonstrar “até que ponto o que reconhecemos como realidade pode não ser muito mais que um jogo de aparências e álibis” (Alan Pauls, Posfácio Mrs. Dalloway). Em outros termos, inventamos a realidade, mas esta invenção é tão real quanto aquilo que inventivamente chamamos de real. Desta maneira, devemos ter o discernimento - antes de iniciar a jornada - de que tanto o real como a invenção da realidade, são incomensuráveis, daí a importância de destrona-los por meio da dimensão crítica e negativa da operação de insubstancializar. Contudo, este é apenas um dos primeiros e dificílimos passos da expedição que leva ao real – "a vida" nos termos de Woolf – e ao seu destronamento. Realizar esta ação exige que se vá ao fundo das coisas (ao seu âmago), bem como reclama um retorno da insubstância à substância. Em vista disto, o movimento é cíclico e o ciclo precisa ser fechado para, contraditoriamente, manter-se aberto e, assim, permitir novas investidas. Por fim, vale lembrar o alerta que uma certa raposa fez a um príncipe viajante vindo de outro planeta: "o essencial é invisível aos olhos”! Portanto, destituir definitivamente a realidade de suas aparências e álibis, ou, nos termos de Karl Marx, chegar na “totalidade orgânica” das coisas e da vida em sociedade, requer que, depois da insubstancialização, se substancialize o insubstancializado, dando conta de produzir, por este modo, a sua DES-insubstancialização.


Jão é chegada a hora de você mesmo ir comprar as flores!


Texto originalmente publicado em 13/11/2016 em

https://desinsubstancializando.weebly.com/principal/november-05th-2016

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